Querido diário
Hoje topei com alguns conhecidos meus
Me dão bom-dia, cheios de carinho
Dizem para eu ter muita luz, ficar com Deus
Eles têm pena de eu viver sozinho
[...]
Hoje o inimigo veio me espreitar
Armou tocaia lá na curva do rio
Trouxe um porrete a mó de me quebrar
Mas eu não quebro porque sou macio, viu
HOLANDA, C. B. Chico. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2013 (fragmento).
Uma característica do gênero diário que aparece na letra
da canção de Chico Buarque é o(a)
O texto de Bernardo Guimarães é representativo da estética romântica. Entre as marcas textuais que evidenciam a filiação a esse movimento literário está em destaque a
No trecho, retirado do conto Retábulo de Santa Joana Carolina, de Osman Lins, a fim de expressar uma ideia relativa
à literatura, o autor emprega um procedimento singular de escrita, que consiste em
Poema tirado de uma notícia de jornal
João Gostoso era carregador de feira livre e morava
no morro da Babilônia num barracão sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e
morreu afogado.
BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira: poesias reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980
No poema de Manuel Bandeira, há uma ressignificação
de elementos da função referencial da linguagem pela
O último longa de Carlão acompanha a operária
Silmara, que vive com o pai, um ex-presidiário, numa casa
da periferia paulistana. Ciente de sua beleza, o que lhe
dá certa soberba, a jovem acredita que terá um destino
diferente do de suas colegas. Cruza o caminho de dois
cantores por quem é apaixonada. E constata, na prática,
que o romantismo dos contos de fada tem perna curta.
VOMERO, M. F. Romantismo de araque. Vida Simples, n. 121, ago. 2012
Reconhece-se, nesse trecho, uma posição crítica aos
ideais de amor e felicidade encontrados nos contos de
fada. Essa crítica é traduzida
Cântico VI
Tu tens um medo de
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
MEIRELES, C. Antologia poética. Rio de Janeiro: Record, 1963 (fragmento).
A poesia de Cecília Meireles revela concepções sobre o
homem em seu aspecto existencial. Em Cântico VI, o eu
lírico exorta seu interlocutor a perceber, como inerente à
condição humana,
da sua memória
mil
e
mui
tos
out
ros
ros
tos
sol
tos
pou
coa
pou
coa
pag
amo
meu
ANTUNES, A. 2 ou + corpos no mesmo espaço. São Paulo: Perspectiva, 1998
Trabalhando com recursos formais inspirados no
Concretismo, o poema atinge uma expressividade que se
caracteriza pela
Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio.
As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram
maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah,
difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família,
dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa
família, frisava, lançando em redor olhares complacentes,
lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]
Quando Margarida resolveu contar os podres todos que
sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa [...]
É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas
Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou
com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não
passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima.
Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia
falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou
o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o
convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo.
" E tem mais coisas ainda, minha queridinha", anunciou
Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com
violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima,
mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?
Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia
Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais.
No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)
Quem não se recorda de Aurélia Camargo, que atravessou o firmamento da corte como brilhante meteoro, e apagou-se de repente no meio do deslumbramento que produzira seu fulgor? Tinha ela dezoito anos quando apareceu a primeira vez na sociedade. Não a conheciam; e logo buscaram todos com avidez informações acerca da grande novidade do dia. Dizia-se muita coisa que não repetirei agora, pois a seu tempo saberemos a verdade, sem os comentos malévolos de que usam vesti-la os noveleiros. Aurélia era órfã; tinha em sua companhia uma velha parenta, viúva, D. Firmina Mascarenhas, que sempre a acompanhava na sociedade. Mas essa parenta não passava de mãe de encomenda, para condescender com os escrúpulos da sociedade brasileira, que naquele tempo não tinha admitido ainda certa emancipação feminina. Guardando com a viúva as deferências devidas à idade, a moça não declinava um instante do firme propósito de governar sua casa e dirigir suas ações como entendesse. Constava também que Aurélia tinha um tutor; mas essa entidade era desconhecida, a julgar pelo caráter da pupila, não devia exercer maior influência em sua vontade, do que a velha parenta.
ALENCAR, J. Senhora. São Paulo: Ática, 2006
O romance Senhora, de José de Alencar, foi publicado em 1875 . No fragmento transcrito, a presença de D. Firmina Mascarenhas como "parenta" de Aurelia Camargo assimila práticas e convenções sociais inseridas no contexto do Romantismo, pois
Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa.
Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que
comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a
roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia,
que explicava como não fazer o que não devia ser feito.
Então surgiram os números racionais e a História,
organizando os eventos sem sentido. A fome desde
sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o
calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada
um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas
que alcança.
BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, Í. (Org.).
Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001
A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi
configura um painel evolutivo da história da humanidade.
Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma
percepção que
Exmº Sr. Governador:
Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados
pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928
[…]
ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas
custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro
considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que
prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando
que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas
históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso;
todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque
se derrubou a Bastilha – um telegrama; porque se deitou
pedra na rua – um telegrama; porque o deputado F.
esticou a canela – um telegrama.
Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929
GRACILIANO RAMOS
RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962
O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na
época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado
ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial,
o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista
para esse gênero, pois o autor
Aquarela
O corpo no cavalete
é um pássaro que agoniza
exausto do próprio grito.
As vísceras vasculhadas
principiam a contagem
regressiva.
No assoalho o sangue
se decompõe em matizes
que a brisa beija e balança:
o verde – de nossas matas
o amarelo – de nosso ouro
o azul – de nosso céu
o branco o negro o negro
CACASO. In: HOLLANDA, H. B (Org.). 26 poetas hoje. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2007
Situado na vigência do Regime Militar que governou o
Brasil, na década de 1970, o poema de Cacaso edifica
uma forma de resistência e protesto a esse período,
metaforizando
TEXTO I
Voluntário
Rosa tecia redes, e os produtos de sua pequena indústria gozavam de boa fama nos arredores. A reputação da tapuia crescera com a feitura de uma maqueira de tucum ornamentada com a coroa brasileira, obra de ingênuo gosto, que lhe valera a admiração de toda a comarca e provocara a inveja da célebre Ana Raimunda, de Óbidos, a qual chegara a formar uma fortunazinha com aquela especialidade, quando a indústria norte-americana reduzira à inatividade os teares rotineiros do Amazonas. SOUSA, I. Contos amazônicos. São Paulo: Martins Fontes, 2004
TEXTO II
Relato de um certo oriente
Emilie, ao contrário de meu pai, de Dorner e dos nossos vizinhos, não tinha vivido no interior do Amazonas. Ela, como eu, jamais atravessara o rio. Manaus era o seu mundo visível. O outro latejava na sua memória. Imantada por uma voz melodiosa, quase encantada, Emilie maravilha-se com a descrição da trepadeira que espanta a inveja, das folhas malhadas de um tajá que reproduz a fortuna de um homem, das receitas de curandeiros
que veem em certas ervas da floresta o enigma das doenças mais temíveis, com as infusões de coloração sanguínea aconselhadas para aliviar trinta e seis dores do corpo humano. "E existem ervas que não curam nada", revelava a lavadeira, "mas assanham a mente da gente. Basta tomar um gole do líquido fervendo para que o cristão sonhe uma única noite muitas vidas diferentes". Esse relato poderia ser de duvidosa veracidade para outras pessoas, mas não para Emilie. HATOUM, M. São Paulo: Cia. das Letras, 2008
As representações da Amazônia na literatura brasileira mantêm relação com o papel atribuído à região na construção do imaginário nacional. Pertencentes a contextos históricos distintos, os fragmentos diferenciam-se ao propor uma representação da realidade amazônica em que se evidenciam
TEXTO 1 Quem sabe, devido às atividades culinárias da esposa, nesses idílios Vadinho dizia-lhe "Meu manuê de milho verde, meu acarajé cheiroso, minha franguinha gorda", e tais comparações gastronômicas davam justa ideia de certo encanto sensual e caseiro de dona Flor a esconder-se sob uma natureza tranquila e dócil. Vadinho conhecia-lhe as fraquezas e as expunha ao sol, aquela ânsia controlada de tímida, aquele recatado desejo fazendo-se violência e mesmo incontinência ao libertar-se na cama.
AMADO, J. Dona Flor e seus dois maridos. São Paulo: Martins, 1966
TEXTO II As suas mãos trabalham na braguilha das calças do falecido. Dulcineusa me confessou mais tarde: era assim que o marido gostava de começar as intimidades. Um fazer de conta que era outra coisa, a exemplo do gato que distrai o olhar enquanto segura a presa nas patas. Esse o acordo silencioso que tinham: ele chegava em casa e se queixava que tinha um botão a cair. Calada, Dulcineusa se armava dos apetrechos da costura e se posicionava a jeito dos prazeres e dos afazeres. COUTO, M. Um do chamado tempo, uma casa chamada terra. São Paulo: Cia. das Letras, 2002
Tema recorrente na obra de Jorge Amado, a figura feminina aparece, no fragmento, retratada de forma semelhante à que se vê no texto do moçambicano Mia Couto. Nesses dois textos, com relação ao universo feminino em seu contexto doméstico, observa-se que O
Yaô
Aqui có no terreiro
Pelú adié
Faz inveja pra gente
Que não tem mulher
No jacutá de preto velho
Há uma festa de yaô
Ôi tem nêga de Ogum
De Oxalá, de Iemanjá
Mucama de Oxossi é caçador
Ora viva Nanã
Nanã Buruku
Yô yôo
Yô yôoo
No terreiro de preto velho iaiá
Vamos saravá (a quem meu pai?)
Xangô!
VIANA, G. Agô, Pixinguinha! 100 Anos. Som Livre, 1997
A canção Yaô foi composta na década de 1930 por
Pixinguinha, em parceria com Gastão Viana, que escreveu
a letra. O texto mistura o português com o iorubá, língua
usada por africanos escravizados trazidos para o Brasil.
Ao fazer uso do iorubá nessa composição, o autor