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Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio.

As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram

maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah,

difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família,

dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa

família, frisava, lançando em redor olhares complacentes,

lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]

Quando Margarida resolveu contar os podres todos que

sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa [...]

É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas

Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou

com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não

passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima.

Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia

falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou

o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o

convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo.

" E tem mais coisas ainda, minha queridinha", anunciou

Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com

violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima,

mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?

Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia

Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais.

No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)

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