
A proposta de um projeto como o "Pão e Poesia" objetiva
inovar em sua área de atuação, pois
João Antônio de Barros (Jota Barros) nasceu
aos 24 de junho de 1935, em Glória de Goitá (PE).
Marceneiro, entalhador, xilógrafo, poeta repentista e
escritor de literatura de cordel, já publicou 33 folhetos e
ainda tem vários inéditos. Reside em São Paulo desde
1973, vivendo exclusivamente da venda de livretos de
cordel e das cantigas de improviso, ao som da viola.
Grande divulgador da poesia popular nordestina no
Sul, tem dado frequentemente entrevistas à imprensa
paulista sobre o assunto.
EVARISTO, M. C. O cordel em sala de aula. In: BRANDÃO, H. N. (Coord.).
Gêneros do discurso na escola: mito, conto, cordel, discurso político,
A biografia é um gênero textual que descreve a
trajetória de determinado indivíduo, evidenciando sua
singularidade. No caso específico de uma biografia
como a de João Antônio de Barros, um dos principais
elementos que a constitui é
Ai se sêsse
Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse
Mas porém se acontecesse De São Pedro não abrisse
A porta do céu e fosse Te dizer qualquer tulice
E se eu me arriminasse E tu cum eu insistisse
Pra que eu me arresolvesse E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse Tarvês que nois dois ficasse
Tarvês que nois dois caísse E o céu furado arriasse
E as virgi toda fugisse ZÉ DA LUZ. Cordel do Fogo Encantado. Recife: Álbum de estúdio, 2001
O poema foi construído com formas do português não padrão, tais como "juntim", "nois", "tarvês".
Essas formas legitimam-se na construção do texto, pois
Da timidez
Ser um tímido notório é uma contradição. O tímido tem
horror a ser notadom quanto mais a ser notório. Se ficou
notório por ser tímido, então tem que se explicar. Afinal,
que retumbante timidez é essa, que atrai tanta atenção?
Se ficou notório apesar de ser tímido, talvez estivesse se
enganando junto com os outros e sua timidez seja apenas
um estratagema para ser notado. Tão secreto que nem
ele sabe. É como no paradoxo psicanalítico, só alguém
que se acha muito superior procura o analista para tratar
um complexo de inferioridade, porque só ele acha que se
sentir inferior é doença.
[...]
O tímido tenta se convencer de que só tem problemas
com multidões, mas isto não é vantagem. Para o tímido,
duas pessoas são uma multidão. Quando não consegue
escapar e se vê diante de uma plateia, o tímido não pensa
nos membros da plateia como indivíduos. Multiplica-os
por quatro, pois cada indivíduo tem dois olhos e dois
ouvidos. Quatro vias, portanto, para receber suas gafes.
Não adianta pedir para a plateia fechar os olhos, ou tapar
um olho e um ouvido para cortar o desconforto do tímido
pela metade. Nada adianta. O tímido, em suma, é uma
pessoa convencida de que é o centro do Universo, e que
seu vexame ainda será lembrado quando as estrelas
virarem pó.
VERISSIMO, L. F. Comédias para se ler na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001
Entre as estratégias de progressão textual presentes
nesse trecho, identifica-se o emprego de elementos
conectores. Os elementos que evidenciam noções
semelhantes estão destacados em:
O negócio
Grande sorriso do canino de ouro, o velho Abílio propõe às donas que se abastecem de pão e banana:
— Como é o negócio?
De cada três dá certo com uma. Ela sorri, não responde ou é uma promessa a recusa:
— Deus me livre, não! Hoje não…
Abílio interpelou a velha:
— Como é o negócio?
Ela concordou e, o que foi melhor, a filha também aceitou o trato. Com a dona Julietinha foi assim. Ele se chegou:
— Como é o negócio?
Ela sorriu, olhinho baixo. Abílio espreitou o cometa partir. Manhã cedinho saltou a cerca. Sinal combinado, duas batidas na porta da cozinha. A dona saiu para o quintal, cuidadosa de não acordar os filhos. Ele trazia a capa de viagem, estendida na grama orvalhada.
O vizinho espionou os dois, aprendeu o sinal. Decidiu imitar a proeza. No crepúsculo, pum–pum, duas pancadas fortes na porta. O marido em viagem, mas não era dia do Abílio. Desconfiada, a moça surgiu à janela e o vizinho repetiu:
— Como é o negócio?
Diante da recusa, ele ameaçou:
— Então você quer o velho e não quer o moço? Olhe que eu conto!
TREVISAN, D. Mistérios de Curitiba. Rio de Janeiro. Record,1979 (fragmento)
Quanto à abordagem do tema e aos recursos expressivos, essa crônica tem um caráter
A literatura de cordel é ainda considerada, por muitos, uma literatura menor. A alma do homem não é mensurável e — desde que o cordel possa exprimir a história, a ideologia e os sentimentos de qualquer homem — vai ser sempre o gênero literário preferido de quem procura apreender o espírito nordestino. Os costumes, a língua, os sonhos, os medos e as alegrias do povo estão no cordel. Na nossa época, apesar dos jornais e da TV — que poderiam ter feito diminuir o interesse neste tipo de literatura — e da falta de apoio econõmico, o cordel continua vivo no interior e em cenáculos acadêmicos.
A literatura de cordel, as xilogravuras e o repente não foram apenas um divertimento do povo. Cordéis e cantorias foram o professor que ensinava as primeiras letras e o médico que falava para inculcar comportamentos sanitários. O cordel e o repente fazem, muitas vezes, de um candidato o ganhador da banca de deputado. E assim, lendo e ouvindo, foi-se formando a memória coletiva desse povo alegre e trabalhador, que embora calmo, enfrenta o mar e o sertão com a mesma valentia.
BRICKMANN, L. B. E de repente foi o cordel. Disponível em: http://pt.scribd.com. Acesso em: 29 fev. 2012 (fragmento).
O gênero textual cordel, também conhecido como folheto, tem origem em relatos orais e constitui uma forma literária popular no Brasil. A leitura do texto sobre a literatura de cordel permite
Logo todos na cidade souberam: Halim se embeiçara
por Zana. As cristãs maronitas de Manaus, velhas e
moças, não aceitavam a ideia de ver Zana casar–se com
um muçulmano. Ficavam de vigília na calçada do Biblos,
encomendavam novenas para que ela não se casasse
com Halim. Diziam a Deus e ao mundo fuxicos assim: que
ele era um mascate, um teque–teque qualquer, um rude,
um maometano das montanhas do sul do Líbano que se
vestia como um pé rapado e matraqueava nas ruas e
praças de Manaus. Galib reagiu, enxotou as beatas: que
deixassem sua filha em paz, aquela ladainha prejudicava
o movimento do Biblos. Zana se recolheu ao quarto. Os
clientes queriam vê–la, e o assunto do almoço era só este:
a reclusão da moça, o amor louco do “maometano".
HATOUM, M. Dois irmãos. São Paulo: Cia. das Letras, 2006 (fragmento).
Dois irmãos narra a história da família que Halim e
Zana formaram na segunda metade do século XX.
Considerando o perfil sociocultural das personagens e os
valores sociais da época, a oposição ao casamento dos
dois evidencia
O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a imagem
de um vidro mole que fazia uma volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta que o rio faz
por trás de sua casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia
uma volta atrás da casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.
BARROS, M. O livro das ignorãças. Rio de Janeiro: Record, 2001.
Manoel de Barros desenvolve uma poética singular,
marcada por “narrativas alegóricas", que transparecem
nas imagens construídas ao longo do texto. No poema,
essa característica aparece representada pelo uso do
recurso de
Meu povo, meu poema
Meu povo e meu poema crescem juntos
Como cresce no fruto
A árvore nova
No povo meu poema vai nascendo
Como no canavial
Nasce verde o açúcar
No povo meu poema está maduro
Como o sol
Na garganta do futuro
Meu povo em meu poema
Se reflete
Como espiga se funde em terra fértil
Ao povo seu poema aqui devolvo
Menos como quem canta
Do que planta
FERREIRA GULLAR. Toda poesia. José Olympio: Rio de Janeiro, 2000.
O texto Meu povo, meu poema, de Ferreira Gullar, foi
escrito na década de 1970. Nele, o diálogo com o contexto
sociopolítico em que se insere expressa uma voz poética que
Concurso de microcontos no Twitter
A nona edição do Simpósio Internacional de
Contadores de História promove concurso de microcontos
baseado no Twitter. Os interessados devem ter uma
conta no Twitter, seguir o @simposioconta e escrever um
microconto de gênero suspense, com tema livre. O conto
deve seguir as regras do Twitter: apenas 140 caracteres.
ELINA, R. Disponível em: www.consuladosocial.com.br. Acesso em: 28 jul. 2010.
Na atualidade, o texto traz uma proposta de utilização do
Twitter como ferramenta que proporciona uma construção
rápida, sintética e definida pelo gênero suspense. Isso
demonstra que essa rede social pode ser uma forma de
inovação tecnológica que
Grupo escolar
Sonhei com um general de ombros largos
que fedia
e que no sonho me apontava a poesia
enquanto um pássaro pensava suas penas
e já sem resistência resistia.
O general acordou e eu que sonhava
face a face deslizei à dura via
vi seus olhos que tremiam, ombros largos,
vi seu queixo modelado a esquadria
vi que o tempo galopando evaporava
(deu para ver qual a sua dinastia)
mas em tempo fixei no firmamento
esta imagem que rebenta em ponta fria:
poesia, esta química perversa,
este arco que desvela e me repõe
nestes tempos de alquimia.
BRITO, A. C. In: HOLLANDA, H. B. (Org.). 26 Poetas Hoje: antologia.
Rio de Janeiro: Aeroplano, 1998.
O poema de Antônio Carlos Brito está historicamente
inserido no período da ditadura militar no Brasil. A forma
encontrada pelo eu lírico para expressar poeticamente
esse momento demonstra que
Uma tuiteratura?
As novidades sobre o Twitter já não cabem em
140 toques. Informações vindas dos EUA dão conta de
que a marca de 100 milhões de adeptos acaba de ser
alcançada e que a biblioteca do Congresso, um dos
principais templos da palavra impressa, vai guardar em
seu arquivo todos os tweets, ou seja, as mensagens
do microblog. No Brasil o fenômeno não chega a tanto,
mas já somos o segundo país com o maior número de
tuiteiros. Também aqui o Twitter está sendo aceito em
territórios antes exclusivos do papel. A própria Academia
Brasileira de Letras abriu um concurso de microcontos
para textos com apenas 140 caracteres. Também se fala
das possibilidades literárias desse meio que se caracteriza
pela concisão. Já há até um neologismo, “tuiteratura",
para indicar os “enunciados telegráficos com criações
originais, citações ou resumos de obras impressas". Por
ora, pergunto como se estivesse tuitando: querer fazer
literatura com palavras de menos não é pretensão demais?
VENTURA, Z. O Globo, 17 abr. 2010 (adaptado).
As novas tecnologias estão presentes na sociedade
moderna, transformando a comunicação por meio de
inovadoras linguagens. O texto de Zuenir Ventura mostra
que o Twitter tem sido acessado por um número cada vez
maior de internautas e já se insere até na literatura. Neste
contexto de inovações linguísticas, a linguagem do Twitter
apresenta como característica relevante
Todo bom escritor tem o seu instante de graça, possui
a sua obra–prima, aquela que congrega numa estrutura
perfeita os seus dons mais pessoais. Para Dias Gomes
essa hora de inspiração veio–lhe no dia que escreveu
O pagador de promessas. Em torno de Zé–do–Burro —
herói ideal, por unir o máximo de caráter ao mínimo de
inteligência, naquela zona fronteiriça entre o idiota e o
santo — o enredo espalha a malícia e a maldade de uma
capital como Salvador, mitificada pela música popular
e pela literatura, na qual o explorador de mulheres se
chama inevitavelmente Bonitão, o poeta popular, Dedé
Cospe–Rima, e o mestre de capoeira, Manuelzinho Sua
Mãe. O colorido do quadro contrasta fortemente com a
simplicidade da ação, que caminha numa linha reta da
chegada de Zé–do–Burro à sua entrada trágica e triunfal na
igreja — não sob a cruz, conforme prometera, mas sobre
ela, carregado pelos capoeiras, “como um crucifixado".
PRADO, D. A. O teatro brasileiro moderno. São Paulo: Perspectiva, 2008 (fragmento).
A avaliação crítica de Décio de Almeida Prado destaca as
qualidades de O pagador de promessas. Com base nas
ideias defendidas por ele, uma boa obra teatral deve
A rua
Bem sei que, muitas vezes,
O único remédio
É adiar tudo. É adiar a sede, a fome, a viagem,
A dívida, o divertimento,
O pedido de emprego, ou a própria alegria.
A esperança é também uma forma
De contínuo adiamento.
Sei que é preciso prestigiar a esperança,
Numa sala de espera.
Mas sei também que espera significa luta e não, apenas,
Esperança sentada.
Não abdicação diante da vida.
A esperança
Nunca é a forma burguesa, sentada e tranquila da espera.
Nunca é figura de mulher
Do quadro antigo.
Sentada, dando milho aos pombos.
RICARDO, C. Disponível em: www.revista.agulha.nom.br. Acesso em: 2 jan. 2012.
O poema de Cassiano Ricardo insere–se no Modernismo
brasileiro. O autor metaforiza a crença do sujeito lírico
numa relação entre o homem e seu tempo marcada por
“Eu quero ter um milhão de amigos" é o famoso
verso da linda canção Eu quero apenas, de Roberto
Carlos. Adaptado aos nossos tempos, o verso representa
o anseio que está na base do atual sucesso das redes
sociais. Desde que Orkut, Facebook, MySpace, Twitter,
LinkedIn e outros estão entre nós, precisamos mais do
que nunca ficar atentos ao sentido das nossas relações.
Sentido que é alterado pelos meios a partir dos quais são
promovidas essas mesmas relações.
O fato é que as redes brincam com a promessa que
estava contida na música do Rei apenas como metáfora.
O que a canção põe em cena é da ordem do desejo cuja
característica é ser oceânico e inespecífico. Desejar
é desejar tudo, é mais que querer. Mas quem participa
de uma rede social ultrapassa o limite do desejo e entra
na esfera da potencialidade de uma realização que vem
tornar problemática a relação entre o real e o imaginário.
TIBURI, M. Complexo de Roberto Carlos. In: Revista Cult,
São Paulo: Bregantini, n. 154, fev. 2011(fragmento).
O verso da canção de Roberto Carlos é usado no artigo
para explicar o sucesso mundial das redes sociais. Para
a autora, essas redes são eficazes, pois