Todo bom escritor tem o seu instante de graça, possui
a sua obra–prima, aquela que congrega numa estrutura
perfeita os seus dons mais pessoais. Para Dias Gomes
essa hora de inspiração veio–lhe no dia que escreveu
O pagador de promessas. Em torno de Zé–do–Burro —
herói ideal, por unir o máximo de caráter ao mínimo de
inteligência, naquela zona fronteiriça entre o idiota e o
santo — o enredo espalha a malícia e a maldade de uma
capital como Salvador, mitificada pela música popular
e pela literatura, na qual o explorador de mulheres se
chama inevitavelmente Bonitão, o poeta popular, Dedé
Cospe–Rima, e o mestre de capoeira, Manuelzinho Sua
Mãe. O colorido do quadro contrasta fortemente com a
simplicidade da ação, que caminha numa linha reta da
chegada de Zé–do–Burro à sua entrada trágica e triunfal na
igreja — não sob a cruz, conforme prometera, mas sobre
ela, carregado pelos capoeiras, “como um crucifixado".
PRADO, D. A. O teatro brasileiro moderno. São Paulo: Perspectiva, 2008 (fragmento).
A avaliação crítica de Décio de Almeida Prado destaca as
qualidades de O pagador de promessas. Com base nas
ideias defendidas por ele, uma boa obra teatral deve