Esses chopes dourados
[...]
quando a geração de meu pai
batia na minha
a minha achava que era normal
que a geração de cima
só podia educar a de baixo
batendo
quando a minha geração batia na de vocês
ainda não sabia que estava errado
mas a geração de vocês já sabia
e cresceu odiando a geração de cima
aí chegou esta hora
em que todas as gerações já sabem de tudo
e é péssimo
ter pertencido à geração do meio
tendo errado quando apanhou da de cima
e errado quando bateu na de baixo
e sabendo que apesar de amaldiçoados
éramos todos inocentes.
WANDERLEY, J. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores poemas brasileiros
do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001 (fragmento).
Ao expressar uma percepção de atitudes e valores
situados na passagem do tempo, o eu lírico manifesta
uma angústia sintetizada na
O RETIRANTE ENCONTRA DOIS HOMENS CARREGANDO UM DEFUNTO NUMA REDE, AOS GRITOS DE: “Ó IRMÃOS DAS ALMAS! IRMÃOS DAS ALMAS! NÃO FUI EU QUE MATEI NÃO"
— A quem estais carregando,
Irmãos das almas,
Embrulhado nessa rede?
Dizei que eu saiba.
— A um defunto de nada,
Irmão das almas,
Que há muitas horas viaja
À sua morada.
— E sabeis quem era ele,
Irmãos das almas,
Sabeis como ele se chama
Ou se chamava?
— Severino Lavrador,
Irmão das almas,
Severino Lavrador,
Mas já não lavra.
MELO NETO, J. C. Morte e vida Severina e outros poemas para vozes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994 (fragmento).
O personagem teatral pode ser construído tanto por meio de uma tradição oral quanto escrita. A interlocução entre oralidade regional e tradição religiosa, que serve de inspiração para autores brasileiros, parte do teatro português. Dessa forma, a partir do texto lido, identificamse personagens que
Morte e vida Severina
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas,
e iguais também porque o sangue
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte Severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia.
MELO NETO, J. C. Obra completa. Rio Janeiro: Nova Aguilar, 1994 (fragmento).
Nesse fragmento, parte de um auto de Natal, o poeta retrata uma situação marcada pela
Pequenos tormentos da vida
De cada lado da sala de aula, pelas janelas altas, o azul convida os meninos,
as nuvens desenrolam-se, lentas como quem vai inventando
preguiçosamente uma história sem fim...Sem fim é a aula: e nada acontece,
nada...Bocejos e moscas. Se ao menos, pensa Margarida, se ao menos um
avião entrasse por uma janela e saísse por outra!
(Mário Quintana. Poesias)
Na cena retratada no texto, o sentimento do tédio
Leia o que disse João Cabral de Melo Neto, poeta pernambucano, sobre a função de seus textos:
“Falo somente com o que falo: a linguagem enxuta, contato denso; falo somente do que falo: a vida seca, áspera e clara
do sertão; falo somente por quem falo: o homem sertanejo sobrevivendo na adversidade e na míngua. Falo somente para
quem falo: para os que precisam ser alertados para a situação da miséria no Nordeste.”
Para João Cabral de Melo Neto, no texto literário,