Érico Veríssimo relata, em suas memórias, um episódio da
adolescência que teve influência significativa em sua
carreira de escritor.
" Lembro-me de que certa noite - eu teria uns quatorze
anos, quando muito - encarregaram-me de segurar uma
lâmpada elétrica à cabeceira da mesa de operações,
enquanto um médico fazia os primeiros curativos num
pobre-diabo que soldados da Polícia Municipal haviam
"carneado". (...) Apesar do horror e da náusea, continuei
firme onde estava, talvez pensando assim: se esse caboclo
pode agüentar tudo isso sem gemer, por que não hei de
poder ficar segurando esta lâmpada para ajudar o doutor a
costurar esses talhos e salvar essa vida? (...)
Desde que, adulto, comecei a escrever romances, tem-me
animado até hoje a idéia de que o menos que o escritor
pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a
nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a
realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a
escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos
tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e
do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica,
acendamos o nosso toco de vela ou, em último caso,
risquemos fósforos repetidamente, como um sinal de que
não desertamos nosso posto."
VERÍSSIMO, Érico. Solo de Clarineta. Tomo I. Porto Alegre:
Editora Globo, 1978
Neste texto, por meio da metáfora da lâmpada que ilumina
a escuridão, Érico Veríssimo define como uma das funções
do escritor e, por extensão, da literatura,
O mundo é grande
O mundo é grande e cabe
Nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
Na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
No breve espaço de beijar.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983
Neste poema, o poeta realizou uma opção estilística: a reiteração de determinadas construções
e expressões lingüísticas, como o uso da mesma conjunção para estabelecer a relação entre as
frases. Essa conjunção estabelece, entre as idéias relacionadas, um sentido de
Quem não passou pela experiência de estar lendo um texto e defrontar-se com passagens já lidas em outros? Os textos
conversam entre si em um diálogo constante. Esse fenômeno tem a denominação de intertextualidade. Leia os seguintes
textos:
I. Quando nasci, um anjo torto
Desses que vivem na sombra
Disse: Vai Carlos! Ser “gauche" na vida
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964)
II. Quando nasci veio um anjo safado
O chato dum querubim
E decretou que eu tava predestinado
A ser errado assim
Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim.
(BUARQUE, Chico. Letra e Música. São Paulo: Cia das Letras, 1989)
III. Quando nasci um anjo esbelto
Desses que tocam trombeta, anunciou:
Vai carregar bandeira.
Carga muito pesada pra mulher
Esta espécie ainda envergonhada.
(PRADO, Adélia. Bagagem. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986)
Adélia Prado e Chico Buarque estabelecem intertextualidade, em relação a Carlos Drummond de Andrade, por