Medo da eternidade
1. Jamais esquecerei o meu aflitivo e dramático contato com a eternidade. Quando eu era muito pequena ainda não tinha provado chicles e mesmo em Recife falava-se pouco deles. Eu nem sabia bem de que espécie de bala ou bombom se tratava. Mesmo o dinheiro que eu tinha não dava para comprar: com o mesmo dinheiro eu lucraria não sei quantas balas. Afinal minha irmã juntou dinheiro, comprou e ao sairmos de casa para a escola me explicou:
– Tome cuidado para não perder, porque esta bala nunca se acaba. Dura a vida inteira.
– Como não acaba? – Parei um instante na rua, perplexa.
5. – Não acaba nunca, e pronto.
Eu estava boba: parecia-me ter sido transportada para o reino de histórias de príncipes e fadas. Peguei a pequena pastilha cor-de-rosa que representava o elixir do longo prazer. Examinei-a, quase não podia acreditar no milagre. Eu que, como outras crianças, às vezes tirava da boca uma bala ainda inteira, para chupar depois, só para fazê-la durar mais. E eis-me com aquela coisa cor-de-rosa, de aparência tão inocente, tornando possível o mundo impossível do qual já começara a me dar conta.
Com delicadeza, terminei afinal pondo o chicle na boca.
– E agora que é que eu faço? – perguntei para não errar no ritual que certamente deveria haver.
– Agora chupe o chicle para ir gostando do docinho dele, e só depois que passar o gosto você começa a mastigar. E aí mastiga a vida inteira. A menos que você perca, eu já perdi vários.
10. Perder a eternidade? Nunca.
O adocicado do chicle era bonzinho, não podia dizer que era ótimo. E, ainda perplexa, encaminhávamo-nos para a escola.
– Acabou-se o docinho. E agora?
– Agora mastigue para sempre.
Assustei-me, não saberia dizer por quê. Comecei a mastigar e em breve tinha na boca aquele puxa-puxa cinzento de borracha que não tinha gosto de nada. Mastigava, mastigava. Mas me sentia contrafeita. Na verdade eu não estava gostando do gosto. E a vantagem de ser bala eterna me enchia de uma espécie de medo, como se tem diante da ideia de eternidade ou de infinito.
15. Eu não quis confessar que não estava à altura da eternidade. Que só me dava aflição. Enquanto isso, eu mastigava obedientemente, sem parar.
Até que não suportei mais, e, atravessando o portão da escola, dei um jeito de o chicle mastigado cair no chão de areia.
– Olha só o que me aconteceu! – disse eu em fingidos espanto e tristeza. – Agora não posso mastigar mais! A bala acabou!
– Já lhe disse – repetiu minha irmã – que ela não acaba nunca. Mas a gente às vezes perde. Até de noite a gente pode ir mastigando, mas para não engolir no sono a gente prega o chicle na cama. Não fique triste, um dia lhe dou outro, e esse você não perderá.
Eu estava envergonhada diante da bondade de minha irmã, envergonhada da mentira que pregara dizendo que o chicle caíra da boca por acaso.
20. Mas aliviada. Sem o peso da eternidade sobre mim.
(LISPECTOR, Clarice. Jornal do Brasil, 06 de jun. de 1970)
Considere os pronomes grifados e o que se afirma sobre eles.
I. Peguei a pequena pastilha cor-de-rosa que representava o elixir do longo prazer. (6° parágrafo). O pronome que recupera a expressão a pequena pastilha cor-de-rosa, evitando sua repetição.
II. A menos que você perca, eu já perdi vários. (9° parágrafo). O pronome vários substitui a palavra chicles, que está subentendida.
III. E, ainda perplexa, encaminhávamo-nos para a escola. (11° parágrafo). O pronome nos retoma os colegas, que está subentendido.
É correto o que se afirma APENAS em:
Assinale a alternativa que indica o número correto de pronomes presentes no trecho a seguir:
“Colocadas as diferenças entre esses eficientes lados de nossa cachola, vamos para o que interessa nessa matéria: as previsões de Daniel Pink para o futuro que estava raiando”.
Assinale a alternativa que apresenta a correta classificação do pronome sublinhado no trecho a seguir: “networking de qualidade em colaboração com outros candidatos”.
Texto
Eu tinha uns quatro anos no dia em que minha mãe morreu. Dormia no meu quarto, quando pela manhã me acordei com um enorme barulho na casa toda. Eram gritos e gente correndo para todos os cantos. O quarto de dormir de meu pai estava cheio de pessoas que eu não conhecia. Corri para lá, e vi minha mãe estendida no chão e meu pai caído em cima dela como um louco. A gente toda que estava ali olhava para o quadro como se estivesse em um espetáculo. Vi então que minha mãe estava toda banhada em sangue, e corri para beijá-la, quando me pegaram pelo braço com força. Chorei, fiz o possível para livrar-me. Mas não me deixaram fazer nada. Um homem que chegou com uns soldados mandou então que todos saíssem, que só podia ficar ali a polícia e mais ninguém.
Levaram-me para o fundo da casa, onde os comentários sobre o fato eram os mais variados. O criado, pálido, contava que ainda dormia quando ouvira uns tiros no primeiro andar. E, correndo para cima, vira meu pai com o revólver na mão e minha mãe ensanguentada. “O doutor matou a dona Clarisse!” Por quê? Ninguém sabia compreender.
(REGO, José Lins do. Menino de Engenho. São Paulo: Global Editora, 2020.)
Em “quando pela manhã me acordei com um enorme barulho na casa toda.” (1º§), o pronome destacado faz parte de uma construção que provoca certo estranhamento no leitor. Seu uso sugere um sentido:
As noções de sintaxe de colocação pronominal, ou seja, as classificações pela posição do pronome são definidas por
(1) próclise que ocorre quando o pronome antecede o verbo;
(2) mesóclise é quando o pronome se coloca no meio do verbo;
(3) ênclise se refere ao pronome colocado no final do verbo.
Leia o excerto retirado do texto e assinale a alternativa em que o uso do pronome e sua classificação estejam corretos:
“A política corporativa do McDonald's era servi-lo a uma temperatura que pudesse causar queimaduras graves em segundos”.
Nas orações “tudo é gravado, ninguém mais será anônimo”, o sentido de generalização é construído por meio:
Assinale a alternativa que indica o número de pronomes presentes no trecho a seguir: “Mas não se preocupem, este é o ciclo natural do Universo. Voltaremos a ser o que fomos por milhares de anos: pó de estrela”.
De acordo com a norma, o pronome grifado poderia ser empregado em ênclise em
Texto I
Texto para as questões 1 a 19
...esse tipo de tragédia pode fazer com que pessoas que lidam com problemas psicológicos tenham momentos de crise intensificados. (linhas 15 e 16)
As duas ocorrências do QUE no segmento acima se classificam, respectivamente, como
A frase em que o pronome LHE apresenta uma função na frase diferente das demais é:
Ao afirmar “Vou fazê-lo.”, no quinto parágrafo, o narrador emprega o pronome átono na posição enclítica. Tal pronome cumpre o papel de relacionar as partes do texto da seguinte forma:
Utilize o texto abaixo para responder a questão.
Texto I
Os caminhões chegaram às sete e meia e todas as famílias que restavam na favela havia muito tempo já estavam de pé. Era difícil continuar na cama. Desde os bons tempos, as mulheres levantavam bem cedo para a lavagem das roupas, para o apanho da água, para o preparo das pobres marmitas. Os homens também. Uns saíam para o trabalho. Outros, em busca do primeiro gole de cachaça no balcão do armazém de sô Ladislau, [...]. As crianças maiores acordavam cedo também, trazendo nos olhos e no estômago a desesperada expectativa. Será que hoje tem pão? Os menores, os nenéns brigando com a vida, dando socos no ar exigindo o peito da mãe ou a mamadeira completada com mais água sempre.
(Conceição Evaristo, Becos da Memória, p.168)
No contexto em que se encontram, os vocábulos destacados em “para a lavagem das roupas, para o apanho da água, para o preparo das pobres marmitas” devem ser classificados, morfologicamente, como: