Ir para o conteúdo principal
Milhares de questões atuais de concursos.

Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anônima viuvez,

Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.

Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões p’ra cantar que a vida.

Ah, canta, canta sem razão!
O que em mim sente ’stá pensando.
Derrama no meu coração
A tua incerta voz ondeando!

Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência

Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!

(PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar, 1997, p. 144) 

O poeta recorre a uma formulação paradoxal em:

© Aprova Concursos - Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1482 - Curitiba, PR - 0800 727 6282