A bem dizer, sou Ponciano de Azeredo Furtado,
coronel de patente, do que tenho honra e faço alarde.
Herdei do meu avô Simeão terras de muitas medidas, gado
do mais gordo, pasto do mais fino. Leio no corrente da
vista e até uns latins arranhei em tempos verdes da
infância, com uns padres–mestres a dez tostões por mês.
Digo, modéstia de lado, que já discuti e joguei no assoalho
do Foro mais de um doutor formado. Mas disso não faço
glória, pois sou sujeito lavado de vaidade, mimoso no trato,
de palavra educada. Trato as partes no macio, em jeito de
moça. Se não recebo cortesia de igual porte, abro o peito:
— Seu filho de égua, que pensa que é?
(...)
Meus dias no Sossego findaram quando fui pegado
em delito de sem–vergonhismo em campo de pitangueiras.
A pardavasquinha dessa intimidade de mato ganhou dúzia
e meia de bolos e eu recriminação de fazer um frade de
pedra verter lágrima. Simeão, sujeito severoso, veio do
Sobradinho aquilatar o grau de safadeza do neto. Levei
solavanco de orelha, fui comparado aos cachorros dos
currais e por dois dias bem contados fiquei em galé de
quarto escuro. No rabo dessa justiça, meu avô deliberou
que eu devia tomar rumo da cidade:
— Na mão dos padres eu corto os deboches desse
desmazelado.
(...)
CARVALHO, José Cândido de. O coronel e o lobisomem.
Rio de Janeiro: José Olympio, 1994. p. 3–5.
Quanto ao estilo e à linguagem empregada no trecho do
romance de José Cândido de Carvalho, nota–se que